Sejamos diretos: o Brique da Vila Belga, evento periódico que ocorre em Santa Maria – RS, é, propriamente, o livre mercado, ainda que visto pela esquerda estatista (talvez justamente por tratar-se de livre mercado, sem se darem conta) como bastião de resistência ao “capitalismo selvagem”.

Explico.

Antes, necessitamos de uma definição precisa para “livre mercado”, purificando o termo de espantalhos ideológicos. Segundo Murray Rothbard (creio, porém, tratar-se de um conceito-consenso entre economistas), o livre mercado (ou mesmo apenas “mercado”) pode significar “propriamente a rede de trocas livres e voluntárias [entre pessoas]”.[1] Apresentado tal conceito, basta analisar o modo como o Brique da Vila Belga (BVB) constitui-se e perceber como ele insere-se na ideia do livre mercado.

De acordo com matéria publicada no “Diário de Santa Maria”, a iniciativa de expor e comercializar produtos diversos em pleno quarteirão histórico da cidade surgiu de um grupo de vizinhos e obteve rapidamente a adesão de feirantes e comerciantes locais. Sem apoio de grandes empresas (ao menos financeiro) ou do poder estatal, a divulgação é feita por eventos criados no Facebook e por jornais locais.[2]

Um dos organizadores, Kalu da Cunha Flores, afirma que “A intenção é que a rua seja um local de lazer. O pessoal ficou bem empolgado, uma vizinha confeccionou as faixas, um comerciante disponibilizou um espaço com banheiro. As pessoas já passam bastante por aqui, fotografam, observam as casas, mas vão embora. A intenção não é nem a geração de renda. Queremos aproximar a comunidade, falar sobre a cultura e o patrimônio local, falar sobre a viação férrea. Aqui temos muitas histórias para contar.” [3]

Eis aí a espontaneidade típica do livre mercado: um grupo de pessoas forja uma ideia, outro grupo de pessoas interessa-se e contribui para sua realização, confeccionando faixas, disponibilizando um espaço com banheiro e assim por diante. Resultado: diz “ARazão”, hoje, que 342 expositores (com previsão de aumento para 450 em agosto) participaram da última (8ª) edição do BVB.[4]

A infinidade de produtos ofertados impressiona: há artesões, feirantes, tenda de licores artesanais e de alimentação, a gloriosa Vento Norte, editora cartonera local, apresentações artísticas e muitos etc’s.

O Brique da Vila Belga em sua 8ª edição, no dia 05 de julho de 2015: interação e livre mercado em Santa Maria - RS. Créditos: Gabriel Haesbaert / A Razão
O Brique da Vila Belga em sua 8ª edição, no dia 05 de julho de 2015: interação e livre mercado em Santa Maria – RS. Créditos: Gabriel Haesbaert / A Razão

Além disso, muitas das pessoas que passam a frequentar o BVB são pessoas que poderiam estar enclausuradas em um shopping center (moralmente, não há problema algum nisso, mas é evidente que a “essência” é distinta), mas estão ali, em um local aberto, conhecendo pessoas novas, interagindo com a cidade e tudo em torno de quê? Do livre mercado.

Isso não significa, pode pensar um apressado leitor, que as pessoas frequentam o Brique apenas objetivando o consumo. Como Flores assinala, o espaço não é necessariamente para a geração de renda, mas um modo de aproximar a comunidade. Indago, entretanto, se isso seria possível sem a quantidade incrível de expositores e comerciantes locais ali instalados. São suas tendas, ao trazerem pessoas interessadas em seus produtos, que acabam levando, para o BVB, pessoas atraídas unicamente pelo espaço proporcionado pelo comércio para se encontrarem com familiares e amigos (mesmo que não percebam que é o livre mercado que provoca essa interação).

Essa é uma breve e obviamente não esgotável exposição de alguns elementos que podemos identificar como típicos do livre mercado no BVB. Fundamentalmente, convém salientar, o livre mercado não é pró-BigCorp, como aqui foi demonstrado indiretamente. O mercado, quando livre, busca, pelo contrário, a distribuição cada vez mais fragmentada do poder econômico, enfraquecendo as BigCorp’s e potencializando o poder de escolha dos demais participantes.

[1] ROTHBARD, Murray N. A Ética da Liberdade. 2. ed. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. p. 100.

[2] MATGE, Pâmela Rubin. Brique da Vila Belga é a novidade para os domingos em Santa Maria. Diário de Santa Maria, Santa Maria, 09 mar. 2015. Disponível em: < http://diariodesantamaria.clicrbs.com.br/rs/geral-policia/noticia/2015/03/brique-da-vila-belga-e-a-novidade-para-os-domingos-em-santa-maria-4714653.html >. Acesso em 06 jul. 2015.

[3] Ibidem.

[4] NORONHA, Joyce. Sol e brique na Vila Belga. A Razão, Santa Maria, 06 jul. 2015. Disponível em: < http://www.arazao.com.br/noticia/69876/sol-e-brique-na-vila-belga >. Acesso em 06 jul. 2015.


Dario Trevisan de Almeida Filho é acadêmico do curso de Letras – Bacharelado em Português e Literaturas na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e membro fundador do Coletivo Boca Livre

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