Os maiores males são tipicamente perpetrados por ideólogos comprometidos com falsas concepções do bem.
Eu cheguei à Terra, provavelmente, na época perfeita para transformar uma criança em um “Star Wars geek”. Tinha 5 anos quando o primeiro filme estreou nos cinemas – obrigado por me levar, mamãe – Eu fiquei enfeitiçado. Esperar anos para cada novo episódio parecia uma eternidade. Olhando pelo lado bom, a espera deu a uma criança a oportunidade de praticar sua telecinesia. E de pensar.
Uma das primeiras lições que tirei de Star Wars – uma que se sustenta até hoje, e tem implicações na política, governo e até no papel dos juízes em uma república – é o que a saga tem a dizer sobre a natureza do Mal. Há muito tempo, quando ainda era um menino, vi George Lucas explicando em uma entrevista que Darth Vader não escolheu ser mau conscientemente. Ele tornou-se mau da mesma forma que acontece com a maioria das pessoas más: enquanto perseguia o que ele achava ser bom. Não consegui localizar a entrevista até então. Em outra entrevista, de 2005, para a Rolling Stone, Lucas explora o tema novamente. A ideia do mal cooptando o bem sempre o inspirou: “Os filmes de John Wayne possuíam diversos vilões, mas não consigo me lembrar de nenhum deles. A maioria dos filmes que eu gostava não tinham vilões realmente fortes. Em filmes como A Ponte do Rio Kwai e Cidadão Kane, o vilão é o mocinho.” Lieutenant Colonel Nicholson, que se assemelha a um Obi-Wan Kenobi de meia idade, se importava profundamente com seus homens. Ele estava apenas tentando protegê-los. Era assim que Lucas via Vader: “A história não é sobre um homem que nasceu um monstro – é sobre um garoto bom e amável, com poderes excepcionais e como estes poderes eventualmente o corromperam.”
Pessoas praticando o mal em nome do bem é como grande parte da maldade do mundo acontece. Quanto mais moralmente benéficos são os seus objetivos, maior a maldade que são capazes de realizar em busca destes. Solzhenitsyn escreveu:
“As auto-justificativas de Macbeth eram fracas – e sua consciência o devorou. Sim, até Iago era um cordeirinho, também. A imaginação e a força espiritual dos malfeitores de Shakespeare pararam em uma dúzia de cadáveres. Porque eles não tinham ideologia. Ideologia – é o que dá à maldade sua tão procurada justificação e dá aos malfeitores a firmeza e determinação necessárias. Essa é a teoria social que ajuda a fazer seus atos parecerem bons ao invés de maus aos seus próprios olhos e dos outros.”
“A crueldade do barão ladrão pode algumas vezes dormir, sua cupidez pode ser em algum momento saciada; mas aqueles que nos atormentam para o nosso próprio bem nos atormentarão sem fim, pois eles o fazem com a aprovação de suas próprias consciências.”
“A experiência deveria nos ensinar a levantar a guarda para proteger a liberdade quando os objetivos do governo são benéficos. Os homens nascidos à liberdade estão naturalmente alertas para repelir a invasão de sua liberdade por governantes mal-intencionados. Os maiores perigos para a liberdade espreitam em insidiosa invasão por homens de zelo, bem intencionados, mas sem a devida compreensão.”
A dinâmica onde a ideologia leva pessoas a praticar o mal em nome do bem não é exclusiva de ideologias totalitárias do nível Solzhenitsyn, como o Nazismo, o Comunismo ou os Sith. O Inspetor Javert era um instrumento de Deus e da Lei.
Ela também aparece em ideologias e políticas banais do nível C.S Lewis. Como imposto sobre o cigarro.
Em 2009, a gestão de Obama aumentou o imposto federal sobre o cigarro para financiar a expansão do plano de saúde para crianças. Estados taxam cigarros em diversos níveis para financiar planos de saúde e outros programas sociais. Impostos mais altos sobre o fumo são uma maneira de o governo guiar as pessoas na direção oposta à este. E se as pessoas ainda assim optam por fumar, a receita das taxas sobre o cigarro é direcionada para uma boa causa. Isso se as pessoas perceberem que estão sendo taxadas. O imposto sobre o cigarro cria oportunidades de lucro para pessoas que os compram em estados com pouca taxação, como a Virgínia, e os vendem ilegalmente em estados cujas taxas são altas, como Nova Iorque. Taxação sobre o cigarro requer coerção, o que significa que aumenta o número de interações violentas entre civis e a polícia, o que, por sua vez, aumenta a probabilidade de alguém se machucar.
Em 2014, a polícia de Nova Iorque estava prendendo Eric Garner sob a suspeita de sonegação do imposto sobre o cigarro quando acidentalmente o mataram. Houve uma série de fatores que contribuíram para o ocorrido, mas não é exagero dizer que o imposto sobre o cigarro matou Eric Garner. Por acaso a morte desnecessária de Garner despertou uma mobilização nacional contra a taxação do cigarro? Não mesmo. Por que? Por conta de uma ideologia que diz que está tudo bem o governo fazer uso da violência, como a polícia fez aqui, em prol de desencorajar o fumo e fazer fumantes pagarem pela saúde de outras pessoas.
Para que você não pense que estou pegando no pé da Esquerda, existe uma ideologia popular na Direita que prega que é bom e apropriado o governo proibir outras drogas. A contagem de cadáveres atribuível a esta ideologia é, provavelmente, muito maior. Inocentes ou não, nenhuma das vítimas do comércio ilegal de drogas precisava morrer. É o mal sendo feito em nome do bem.
Para mim, a pior parte da saga Star Wars é a implausibilidade da sedução de Vader pelo Lado Negro da Força. Lucas tentou torná-la crível. Mas quando o papel do influenciador de Vader foi atribuído a um político, a um manipulador emocional, a quem ele mesmo acredita estar fazendo o bem, Lucas nos presenteou com um vilão tão caricato que ele literalmente sinaliza para o telespectador quando está sendo mau ao mudar seu tom de voz. (Lucas também nos deixa saber quem são os vilões ao dar-lhes olhos amarelos.) Não é assim que o Mal funciona, e não é assim que se convence uma criança de bom coração a se tornar um genocida.
Independente disso, Lucas explica a queda de Vader como o mal feito em nome do bem. Podemos ver que Lucas ao menos tentou fazer a escolha de Vader parecer plausível. E certamente, no episódio VI, o próprio Vader concorda que foi isso que aconteceu com ele.
A compreensão de que a maldade chega travestida de bondade – que o conflito entre bem e mal é, na verdade, uma competição entre duas concepções do bem – é a lição mais importante de Star Wars sobre a natureza humana. Star Wars nos adverte sobre nosso potencial para a corrupção e do consequente perigo quando o poder é centralizado nas mãos de qualquer pessoa.
O insight mais importante de Star Wars implica em 4 ensinamentos sobre política e governo.
Juízes “textualistas” ou “originalistas”, cujas crenças são as de limitar o poder do estado através da restrição do governo ao significado original do texto das constituições e estatutos, podem (e muitas vezes fazem), ainda assim, tratar a lei como um processo criativo de expansão de poder, mesmo quando censuram tal prática. O fato de que esses juízes ao menos sinalizaram a intenção de limitar o mal que o homem pratica, ao interpretarem o poder do governo, os restringe mais do que caso não o tivessem.
Em suma, Star Wars instrui nações, planetas, sistemas e galáxias a adotarem um regime de liberdade, cujo principal benefício, Friedrich Hayek pontuou, é o de viver em um “sistema em que homens maus geram menos prejuízos à sociedade.”
Autor: Michael F. Cannon é o diretor de estudos sobre políticas públicas na área da saúde do Instituto Cato. Seu texto, em inglês, foi originalmente publicado no site libertarianism.org
Tradução: Clube Farroupilha