Essa é a quarta parte da série A Farsa da Teoria da Exploração Internacional. A quarta parte é mais breve, e tratará da questão dos recursos naturais. Nas escolas, aprendemos que a economia mundial é um sistema de trocas desonesto. Os países pobres e periféricos exportam matéria-prima por um preço barato, e são obrigados a comprar produtos tecnológicos com preços caros e injustos. Os nossos recursos são explorados, e os estrangeiros se refastelam com as nossas riquezas, entregues a “preço de banana”. Mais um motivo pelo qual as nações desenvolvidas só são ricas conquanto o resto do mundo continue pobre.
A verdade é a alegação de que “os preços dos nossos produtos são muito baratos” é totalmente infundada. Qualquer empresa, seja ela privada ou estatal, nacional ou estrangeira, sempre irá querer auferir o maior lucro possível, vendendo o seu produto pelo maior preço que conseguir barganhar. Se o preço de qualquer coisa, seja o café ou o trigo, está “muito baixo” (como se alguém pudesse definir arbitrariamente o que é um valor ideal), é porque a concorrência não o permite aumentar. Em qualquer setor da economia, tentar vender um produto acima do preço de mercado faz os consumidores consumirem menos e comprarem mais dos concorrentes, além de substituírem o produto por outro de utilidade semelhante.
Um caso famoso é o da exploração do Nióbio. O minério tem uma infinidade de aplicações, sendo uma matéria-prima importantíssima na indústria aeroespacial. O Brasil detêm 98% das reservas conhecidas, sendo responsável por 80% da produção mundial. Dada a utilidade e importância desse insumo, não faltam nacionalistas exigindo que o governo estatize a mineração do produto, use o monopólio para colocar o preço nas alturas e aproveite a riqueza gerada para usá-la em benefício do povo brasileiro.
Essa é uma visão extremamente simplista. Se fosse tão fácil aumentar o preço para níveis altíssimos, por que as duas empresas que atualmente exploram o nióbio brasileiro não fazem isso? Elas iriam obter lucros extraordinários. Será que os donos dessas empresas não conseguem enxergar uma oportunidade tão óbvia de aumentar drasticamente as suas receitas? Ou eles não estão interessados em ganhar dinheiro? Ou seria uma conspiração internacional para prejudicar o Brasil e beneficiar o resto do mundo?
O fato é que um aumento de preço indiscriminado sempre gera duas consequências inevitáveis: o aumento da concorrência e a busca por produtos substitutos. Para extrair o nióbio, são necessários grandes investimentos em ciência e tecnologia de mineração e refinamento. Por causa disso, há inúmeras jazidas conhecidas no Brasil e no resto do mundo que nunca foram exploradas, devido ao custo financeiro. Todavia, se o preço ficasse mais alto, esse investimento valeira a pena, aumentando a quantidade de ofertantes. Além disso, em todos os locais do mundo, haveria uma busca incessante por novas reservas, o que poderia comprometer ainda mais a posição monopolística brasileira. E, por fim, por mais que o nióbio seja importante, ele não é insubstituível. Outros minérios como o titânio, o tântalo e o vanádio podem cumprir o seu papel, ainda que não tão eficientemente.
Portanto, os preços não são ditados “pelos países ricos”, mas sim, tão e simplesmente pelas regras impessoais do mercado. Se as mercadorias agrícolas e minerais tem uma cotação mais baixa que as industriais, é porque tem uma estrutura de produção menor e contêm menos valor agregado.
Além disso, não há nenhuma razão que justifique a afirmação de que os países ricos impedem o desenvolvimento dos outros por causa desse sistema de trocas. Muito pelo contrário. Todas essas riquezas que são ou já foram exportadas pelos países subdesenvolvidos – açúcar, café, petróleo, ferro, manganês, cobre, petróleo, borracha, cacau, algodão, estanho, alumínio, tabaco, bananas, nitratos, gado, etc. – só tem alguma utilidade porque alguém as compra, para consumo ou como matéria-prima para a fabricação de outros bens.
Eles seriam mais pobres ainda. É o conhecimento técnico-científico que permite converter matéria-prima bruta em coisas úteis. Se os minérios do Brasil não fossem exportados, eles não serviriam para promover a nossa indústria, mas sim continuariam eternamente soterrados. Inúmeros países ganham a maior parte das suas receitas por meio da exportação de petróleo, como é o caso da Noruega, da Venezuela, da Nigéria e da Angola. A principal utilidade do petróleo, que é servir como combustível, surgiu no final do século 19, quando um alemão inventou o motor à combustão, e no começo do século 20, quando um industrial americano começou a produzir carros em massa. Sem o surgimento dos veículos automotores, o “ouro negro” continuaria soterrado sem ser usado para nada, e os países que o exportam teriam uma qualidade de vida bem menor.
Foram cientistas e empresários dos países desenvolvidos que, no século 19, financiaram ou pesquisaram as investigações que levaram ao surgimento da eletricidade. E para a transmissão de energia elétrica, passou a ser usado o cobre, por meio de fios e cabos. Um país que se beneficiou enormemente disso foi o Chile, com inúmeras minas em seu território. Atualmente mais da metade das exportações chilenas depende do cobre. Se não fossem pelos países desenvolvidos, que compram o minério que eles mesmos deram utilidade, o Chile seria um país com muito menos recursos financeiros.
O mesmo é válido para os produtos alimentícios. Com a Revolução Industrial, a riqueza gerada pelas indústrias permitiu que os europeus se dessem ao luxo de começar a pagar pela importação de uma série de mercadorias do resto do mundo, o que incluía carne, trigo, café e outros tantos alimentos. A demanda por cada um desses bens ajudou a alavancar o crescimento, respectivamente, da Nova Zelândia, da Argentina e do Brasil.
No começo do século 20, a borracha era o único produto que era tão importante para os brasileiros quanto o café. E ela, por sua vez, só era uma mercadoria útil porque em 1844 o estadunidense Charles Goodyear descobriu o processo de vulcanização da borracha, que daria origem aos pneus. É verdade que o ideal seria que naquela época o Brasil não exportasse café e borracha, mas sim máquinas e produtos industriais, e sua principal riqueza não viesse do setor extrativista e agrícola, mas do industrial. Mas só porque não éramos – e ainda não somos – um país industrial, isso não significa que trocar bens primários por produtos mais trabalhados seja prejudicial para os brasileiros.
Isso leva a outro ponto: para crer que os países ricos travam o nosso desenvolvimento, também é necessário ignorar todas as invenções que seus cidadãos criaram e espalharam para o resto do mundo. Chega a ser assustador pensar o quão pior seria a qualidade de vida dos países subdesenvolvidos, se eles nunca tivessem entrado em contato com a eletricidade, o telefone, o rádio, a lâmpada, a água encanada, as ferroviais, o motor à combustão, os antibióticos, as vacinas, os produtos de higiene, as baterias, as calculadoras, os computadores, os microchips, a internet, as geladeiras, os celulares e outras tantas invenções desenvolvidas por pessoas criativas e dedicadas de países livres e empreendedores, e que tanto melhoraram o bem estar e a qualidade de vida do mundo.
Mesmo que seja prejudicial exportar commodities e importar eletrônicos (e essa é uma questão que não cabe ser discutida agora), ainda assim não se pode ignorar o fato que essas máquinas são compradas justamente porque melhoram o nosso padrão de vida. Não faz sentido alegar que os países ricos só alcançaram qualidade de vida por meio de um sistema comercial injusto que trava as nações subdesenvolvidas, se sem esse mesmo sistema os países subdesenvolvidos estariam ainda mais pobres.
Confira os outros artigos da série: Parte I, Parte II, Parte III.
Autor: Luciano Rolim é um empreendedor e investidor libertário, autodidata e escreve para o site do Clube Farroupilha todas as segundas-feiras.
As informações, alegações e opiniões emitidas no site do Clube Farroupilha vinculam-se tão somente a seus autores.