Ao final de novembro, o Banco Mundial divulgou um abrangente e detalhado relatório sobre o setor público brasileiro.

Embora as descobertas não tenham trazido grandes novidades para quem já conhece o assunto, os números, ainda assim, impressionam.

Para começar, entre 53 países pesquisados, o Brasil é o que a apresenta a maior diferença entre o salário de um funcionário público federal e o de um trabalhador da iniciativa privada, ambos com a mesma idade, a mesma formação e a mesma experiência profissional.

Pegando um exemplo prático: suponha dois irmãos gêmeos com a mesma formação e a mesma experiência profissional. Um escolheu uma carreira em uma grande empresa; o outro foi aprovado em um concurso para funcionário público federal. Esse último ganhará simplesmente 67% a mais.

Esta é a média da diferença entre os salários do setor público e do setor privado no Brasil. Para se ter uma ideia, no resto do mundo, o setor público paga em média “apenas” 16% a mais que o setor privado.

Ou seja, a situação brasileira simplesmente não tem par.

E piora: o gasto do país com funcionários públicos (agora de todas as esferas de governo) é de 13,1% do PIB. Trata-se também do maior percentual entre todos os países analisados. Muito acima de países como Portugal, França, Austrália e EUA. Nestes, o gasto do governo com funcionalismo público é de aproximadamente 9% do PIB.

Já o Chile gastou somente 6,4% do PIB em salários do funcionalismo público em 2015.

Ou seja, em relação à renda, o Brasil gasta 45% a mais que os países mais ricos com seus funcionários públicos. Em relação ao Chile, gastamos incríveis 104% a mais.

E um detalhe curioso: ainda segundo o Banco Mundial, o quadro do funcionalismo público brasileiro pode ser considerado “enxuto” em relação ao resto do mundo. Ao passo que, no Brasil, 5,6% da população empregada está no setor público, nos países da OCDE este percentual é de quase 10%.

A conclusão óbvia, portanto, é que o alto gasto com funcionalismo público no Brasil não decorre exatamente de um excessivo número de funcionários público, mas sim do elevado custo (altos salários) deles.

Mais: considerando todo o funcionalismo público federal, nada menos que 83% dos funcionários estão no topo da pirâmide da renda, compondo assim a parcela mais rica da população. E sete em cada dez estão no grupo dos 10% mais ricos do país.

Assim, o governo é simplesmente o maior concentrador de renda e maior causador das desigualdades sociais no Brasil.

Segundo o relatório:

Com base em dados de 2016, os militares brasileiros recebem, em me´dia, mais do que o dobro pago pelo setor privado (R$ 55.000 por ano), e os servidores federais civis ganham cinco vezes mais que trabalhadores do setor privado (R$130.000 por ano). A remunerac¸a~o me´dia por funciona´rio e´ excepcionalmente alta no Ministe´rio Pu´blico Federal (R$ 205.000 por ano), no Poder Legislativo R$ 216.000 por ano) e no Poder Judicia´rio (R$ 236.000 por ano).

Além desses salários magnânimos, há também vários benefícios (penduricalhos) atrelados ao cargo, como auxílio-moradia, auxílio-transporte, auxílio-creche, auxílio-educação, auxílio-funeral, auxílio plano de saúde, reembolso por despesas médicas e odontológicas não cobertas pelo plano de saúde, retribuição por acúmulo de funções, bônus de eficiência etc.

Só o auxílio-moradia dos juízes custa R$ 1 bilhão por ano aos pagadores de impostos.

A coisa é tão surreal que um juiz morando em uma mansão, se locomovendo em carro chique com motorista particular, e com filho em escola privada caríssima recebe auxílio-moradia, auxílio-transporte e auxílio-educação.

E o descalabro se manifesta desde o início: ao passo que um advogado recém-formado é contratado por cerca de R$ 3.100 no setor privado, se ele fizer concurso para o Poder Executivo começará já com um salário de R$ 18.283. Nos poderes Legislativo e Judiciário, os salários de advogados que estão começando são ainda mais altos: cerca de R$ 30 mil por mês.

Para completar, além dos salários astronômicos e dos penduricalhos, os funcionários públicos também gozam estabilidade de emprego.

E tudo isso bancado pelos impostos pagos por quem trabalha e produz riqueza — e, consequentemente, ganha bem menos.

O trabalhador do setor privado, que é quem produz e é tributado para sustentar toda essa farra — não houvesse trabalhador do setor privado, não haveria salário para funcionalismo público —, tem uma renda média de R$ 2.100 por mês.

A injustiça causada pelo estado não poderia ser mais fragorosa: todos os privilégios do setor público são bancados por impostos e endividamento do governo, os quais são integralmente pagos pela iniciativa privada, a qual também é asfixiada pelo governo com burocracias e regulamentações.

Logo, é exatamente o setor privado quem sustenta essa farra do setor público. Daí os baixos salários pagos na iniciativa privada. Toda a carga tributária existente no Brasil, que impede aumentos salariais na iniciativa privada, existe exatamente para sustentar o setor público e seus funcionários que ganham salários magnânimos e vivem à custa dos trabalhadores da iniciativa privada, os quais ganham pouco exatamente porque têm de bancar os membros do setor público.

As causas

Tentar estabelecer as causas deste descalabro exigiria um trabalho minucioso e profundo, algo muito além do escopo deste artigo. A Constituição de 1988, que concedeu vários “direitos” e nenhum dever ao funcionalismo público — na versão originalmente aprovada, funcionários públicos se aposentariam com salário integral e eram isentos de pagar qualquer contribuição previdenciária —, certamente está raiz.

Mas ela, por si só, não explica tudo.

Porém, utilizando a lógica dedutiva, é possível chegar a uma constatação básica: os sindicatos do funcionalismo público desempenharam um papel fundamental no aprofundamento deste estado de coisas.

Os funcionários públicos sempre foram uma categoria extremamente organizada e combativa na exigência de seus “direitos” (isto é, na pilhagem dos impostos pagos pela população). Já, eles sempre formaram uma base eleitoral extremamente influente e poderosa.

Os funcionários públicos sempre estiveram na base eleitoral do PT, o qual, por sua vez, nunca sequer escondeu que faz políticas voltadas a agradar exatamente esta classe.

Adicionalmente, qualquer político (do PT ou não) que ousar contrariar as exigências dos sindicatos do funcionalismo público será massacrado pelos sindicatos e não conseguirá ser reeleito.

A consequência é que este enorme poder exercido pelos sindicatos dos funcionários públicos significa que são eles que efetivamente exercem o poder de tributar. Dado que os sindicatos dos funcionários públicos podem facilmente forçar os políticos a elevar gastos e impostos para que a receita atenda às suas exigências de privilégios, são eles, e não os eleitores, que controlam o crescimento dos gastos do governo e da carga tributária dentro da jurisdição política. 

Assim, funcionários públicos e seus sindicatos se tornaram a perfeita ilustração daquilo que se convencionou chamar de “tributação sem representação” (não que a tributação com representação seja muito melhor): o povo trabalhador paga impostos escandinavos para bancar esta classe e, em troca, recebe serviços moçambicanos.

Os sindicatos atuam de várias maneiras para garantir seus privilégios. Por exemplo, dado que eles estão primordialmente interessados em maximizar suas receitas, eles utilizam as regulamentações do setor público como ferramenta para proteger o emprego de absolutamente qualquer burocrata estatal, não importa o quão incompetente ou irresponsável ele seja. Afinal, quanto menos burocratas estiverem empregados, menor será o volume das contribuições pagas aos sindicatos pelos seus membros. 

Assim, é praticamente certo que os sindicatos irão à justiça (também comandada por funcionários públicos sindicalizados) para recorrer de qualquer tentativa de dispensa de qualquer funcionário público. Isso significa que demitir um funcionário incompetente ou mesmo corrupto, por exemplo, pode levar meses, ou anos, de disputas jurídicas.

Adicionalmente, os sindicatos dos funcionários públicos também são os paladinos da “sinecura” — a prática sindical de obrigar o governo a contratar mais do que o número de pessoas necessárias para fazer algum serviço. 

Como no setor público não há preocupações com lucros e prejuízos, e a maioria das agências é monopolista, a conta é simplesmente repassada aos pagadores de impostos. Sinecuras no setor público são vistas como um benefício tanto para os políticos quanto para os sindicatos — mas certamente não para os pagadores de impostos. Os sindicatos auferem mais receitas quando há um maior número de burocratas empregados, e os políticos ganham a simpatia dos sindicatos por terem nomeado ou permitido a contratação de mais funcionários públicos. 

Cada emprego criado desta forma geralmente significa dois ou mais votos, dado que o burocrata sempre poderá arrumar para o político o voto de pelo menos um membro da família ou de um amigo próximo. 

Por tudo isso, cada sindicato de funcionários públicos é uma máquina política de fazer uma implacável e inflexível pressão por maiores impostos, maiores gastos governamentais, mais sinecuras e mais promessas de generosas pensões.

E a fatura vai integralmente para a população.

Conclusão

Já era passada a hora de esta trágica questão se tornar mainstream e ser abordada abertamente pelos meios de comunicação. Felizmente, está havendo uma maior disseminação da informação e, pela primeira vez, há alguma chance de algo ser efetivamente feito contra esse descalabro.

No entanto, a grande massa dos pagadores de impostos parece ainda não ter se dado conta de que eles, na realidade, são os escravos — e não os mestres — do governo em seus três níveis. A questão é saber até quando permanecerão neste estado de ignorância. As pesquisas eleitorais — a estarem corretas — mostram que eles estão dispostos a aceitar mais desse arranjo.

Via: Instituto Mises Brasil 

Autor: Stêvão Limana

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