Eis que uma possibilidade longínqua de afronta à livre iniciativa e precificação se torna ainda mais palpável e temerosa em nossa cidade. O projeto de lei de autoria do vereador Luciano Zanini Guerra (PT) estabelece a meia entrada aos professores da iniciativa privada e pública, sejam eles da esfera Municipal, Estadual e Federal, universitários, básicos e secundários, de forma unânime, abrangendo todos os professores que desenvolvem suas atividades em Santa Maria. O projeto em questão lhes possibilita um desconto de 50%, forçado, em estabelecimentos que propiciem lazer e cultura.
O referido projeto foi aprovado junto à câmara de vereadores na sessão plenária do dia 26 de dezembro, bastando apenas a sanção do prefeito Jorge Pozzobom (PSDB) para se tornar realidade.
Tendo em vista o grande impacto que tal medida pode vir a ter no cenário cultural santa-mariense, o Clube Farroupilha vê-se na necessidade de pedir cautela ao prefeito Jorge Pozzobom. Para auxiliá-lo na tomada de decisão, reunimos uma série de argumentos contra essa medida imposta aos estabelecimentos e empreendedores, visto que acreditamos que a mesma favorece uma categoria em desfavor dos demais consumidores.
Para iniciar, podemos citar o processo desenvolvido por um empreendedor no momento de construção de um evento cultural: o cálculo mais básico realizado consiste em somar o custo total previsto para o show, e dividir entre os possíveis clientes, tendo como regra a sobra de algum valor referente ao lucro. Porém, uma vez aprovada uma lei que diminua valores de ingressos específicos, não há a certeza de quantos serão os pagantes integrais ou parciais. Diante dessa incerteza, o empreendedor, para seguir com sua margem de lucro e evitar possíveis prejuízos, aumenta o valor do ingresso, o que acaba por afetar todos os demais consumidores, em especial os mais pobres. Logo, uma das possíveis consequências dessa alteração de preço será a impossibilidade de participação de determinados grupos, uma vez uma parcela maior de sua renda teria de ser destinada à participação em eventos culturais.
Além disso, cabe ressaltar que essa situação já é agravada pela existência da lei federal Nº 12.933, lei da meia entrada, que garante a reserva de 40% de ingressos para estudantes, ao preço da metade do valor usual. Nesse sentido é importante referenciar o estudo de Carlos Martinelli da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEAUSP), o qual indica que o número de beneficiários da meia entrada em alguns eventos atinge a marca de 80% do público frequentador. Tendo isso em vista, não é difícil perceber que haverá um grande desequilíbrio entre os valores arrecadados e os custos, o que acarreta na medida comumente empregada nesses casos e já citada acima: onerar os pagadores restantes não enquadrados em nenhum benefício, a fim de suprir os custos extras gerados pela classe beneficiada pela medida.
Outra consequência eminente é diminuição dos eventos culturais na cidade, uma vez que a atividade será mais laboriosa e com menores lucros para os empresários. Soma-se a isso a possível mudança nas preferências do consumidor devido aos maiores preços, e o resultado que obtemos dessa medida é exatamente o oposto de seu objetivo: a redução do número de frequentadores e de eventos culturais em nossa cidade.
Outro fator importante a ser considerado é a falta de diferenciação entre os diversos segmentos de professores: a medida coloca em mesmo patamar professores de educação infantil da iniciativa municipal, com média de salário de R$ 1.482,26 (vide edital do concurso Nº 001/2017 do município), e professores universitários federais, com salários que em média ultrapassam os R$ 13.000, segundo estudo realizado pela revista Quero Bolsa, compilando dados obtidos no portal da transparência do ano de 2016. Entre os dois casos há uma clara disparidade de salários, ignorada pela medida, a qual considera todos igualmente hipossuficientes, e proporciona descontos a uma categoria, como a de professores universitários, a qual ganha sete vezes mais se comparado ao salário médio do trabalhador brasileiro, com rendimentos de R$ 1.800 em média.
Não sabemos ao certo quais os motivos que levaram o vereador a tomar tal iniciativa, seja ela pautada pela busca por capital político e votos – dado ao grande número de instituições de ensino na cidade – ou se foi fruto da benevolência do mesmo. Porém, não podemos deixar de observar que ele ignora tanto o funcionamento e gerenciamento de negócios, quanto as regras que regem a economia. Afinal, como obrigar um estabelecimento a reduzir os valores dos seus ingressos, sem que haja uma diminuição nos custos ou aumento de produtividade? O poder público mais uma vez ignora as consequências de seus atos e impõe as suas próprias regras à economia.
Para endossar sua proposição, o vereador elencou algumas justificativas, como a importância do acesso a lazer e entretenimento, e diz ser um dever do estado facilitar o acesso à cultura. Porém, aproveitamos a ocasião para fazer o seguinte questionamento: não seria esse argumento controverso, uma vez que a decisão acabará por onerar ainda mais o público comum, afastando-o de seus momentos de lazer culturais? O vereador parece desconsiderar o caminho mais simples: aquele relativo a desburocratização e a diminuição dos impostos, o qual de fato poderia aumentar a produtividade dos empresários, e proporcionar mais atrações a nossa cidade a baixos custos.
Aproveitamos também para levantar mais uma questão: se há tanto interesse que a população participe de mais eventos culturais – interesse manifestado pelos nossos parlamentares nas legislações brasileiras como a Constituição Federal – porque a carga tributária que incide sobre os eventos culturais é estimada em 40%, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT)?
Agora nos resta pedir ao Prefeito Jorge Pozzobom que tome a decisão de maneira ponderada, e que o veto ocorra para que o acesso à cultura e ao lazer não se torne proibitivo e extremamente oneroso para a população santa-mariense. O que nossa cidade e o Brasil precisam não é de benesses para grupos específicos, e sim de liberdade, por meio da desburocratização dos serviços e redução de impostos.
Por fim, deixamos nossos votos para que Santa Maria retome seu título de cidade cultura, e caminhe rumo a um futuro mais próspero e livre.