Por trás de todo comportamento “salvador do mundo” há algo de psicótico, muitas vezes com traços de autoritarismo e um sentimento quase religioso.
É partindo de bases filosóficas bastante sólidas que podemos diferenciar muitas das teorias e ideologias que nos cercam hoje bem como seus respectivos caráteres, da origem platônica do marxismo à originalidade do liberalismo clássico a seu tempo. E é também partindo desses pontos que podemos perceber o apelo psicológico que exerce cada ideologia sobre diferentes pessoas.
O economista e ganhador do prêmio Nobel, Milton Friedman, diz que um dos principais ensinamentos do liberalismo é a humildade, e afirma no livro “Capitalismo e Liberdade”:
“Aqueles, dentre nós, que acreditam em liberdade devem crer também na liberdade dos indivíduos de cometer seus próprios erros. Se um homem prefere, conscientemente, viver o dia de hoje, usar seus recursos para se divertir, escolhendo deliberadamente uma velhice de privações, com que direito podemos impedi-lo de agir assim? Podemos argumentar com ele, tentar persuadi-lo de que está errado. Mas podemos usar a coerção para impedi-lo de fazer o que deseja fazer? Não existirá a possibilidade de que esteja ele certo e nós errados? A humildade é a virtude que distingue o indivíduo que acredita na liberdade; a arrogância é a que distingue o paternalista.”
Não se trata de enaltecer os liberais como humildes e assim elevá-los à uma categoria maior, muito pelo contrário. O que ressalto é a tendência que as ideologias liberais tem de reconhecer a falibilidade das pessoas e de suas ideias, incluindo-se aí, e por isso não conceber a existência e aplicabilidade de qualquer doutrina redentora, que possibilitaria a criação de um paraíso na terra. Talvez um mundo liberal fosse como um filme sem grandes emoções, sem grandes mocinhos e vilões e nem mesmo uma garantia de final feliz ou triste.
É algo comum um comportamento que busque soluções milagrosas para os problemas aparentes que enfrentamos e, por isso, também a busca no meio político de teorias e ideologias que apresentem as mesmas características. Trata-se da busca de um conforto psicológico em todos os âmbitos da vida e a recusa de certos aspectos da realidade que possam parecer cruéis à todos aqueles que nutrem um sentimento de justiça e bondade, bastante presentes em certas posturas políticas e quase sempre questionáveis se considerarmos a filósofa Ayn Rand no seguinte trecho do prefácio de “A Base Moral do Individualismo” (tradução livre):
“Os maiores horrores da história foram perpetrados—não em razão e nome daquilo que os homens têm como mal, ou seja, o egoísmo—mas através de, por, para e em nome de um propósito altruísta. A Inquisição. Guerras religiosas. Guerras civis. A Revolução Francesa. A Revolução Alemã. A Revolução Russa. Nenhum ato de egoísmo jamais se igualou às carnificinas perpetuadas por discípulos do altruísmo. Nem jamais um egotista despertou massas de seguidores fanáticos ordenando-os a lutar para o ganho dele. Todos líderes reuniram homens usando slogans com propósitos altruístas, através do apelo ao auto sacrifício para um objetivo altruísta maior: a salvação das almas dos outros, a propagação do esclarecimento, o bem comum de seu estado.”
Não há salvação no liberalismo pura e simplesmente porque a ideologia liberal não admite um conceito moral de salvação e nem tem por objetivo uma panaceia, um remédio para todos os males, não há meios de se alcançar, demarcar e medir a verdade, o que difere radicalmente o liberalismo de muitas das outras correntes ideológicas que existem e também o torna insosso e pouco palatável à todos que desejam e buscam fórmulas para a salvação de tudo e todos.
Esse texto foi inspirado pelo podcast do Insituto Mises Brasil com o filósofo e professor da UFRJ Alberto Oliva, que aprofunda bastante a questão. Acesse aqui.
Vinícius Motta é acadêmico de História da UFSM, e escreve para o site do Clube Farroupilha.
As informações, alegações e opiniões emitidas no site do Clube Farroupilha vinculam-se tão somente a seus autores.
Comments are closed.
1 Comment