Ditadura Militar Brasileira

Este texto faz parte de uma série sobre a Ditadura Militar: PAEG – As Bases de uma Bomba RelógioFigueiredo e o preço da intervenção estatal e O milagre keynesiano brasileiro e o milagre liberal chileno, qual foi melhor?

Durante o período de 1968 a 1973, o Brasil viveu o “Milagre Econômico”. Com altas taxas de crescimento econômico (média de 10% ao ano), o plano econômico que deu origem a esse boom foi arquitetado pelo então Ministro da Fazenda Antônio Delfim Netto. Entretanto o mesmo também aumentou o endividamento externo e interno assim como a inflação (por mais que a mesma tenha caído em relação ao governo de João Goulart). Com o Primeiro Choque do Petróleo (1973), essa política keynesiana começou a apresentar rachaduras. Isso porque, para funcionar, a mesma era dependente de empréstimos externos, da importação de bens de capital (maquinário, cujo preço nos anos seguintes ao choque começou a aumentar) e de petróleo (cujo preço subiu assustadoramente).

Em 1973, o general Ernesto Geisel assumiu o governo e tinha duas escolhas para encarar esse cenário: manter o pé no acelerador (adotar medidas heterodoxas), ou pisar no freio (adotar medidas ortodoxas). Para dar respaldo ao regime e manter o clima de euforia alcançado nos primeiros anos da ditadura, o governo decidiu manter o pé no acelerador. Além do mais, caso optasse por uma pausa no crescimento, o desemprego aumentaria no curto prazo.

Podemos comparar o Brasil a um bêbado, que tomou altas doses de caipirinha durante os anos do “milagre”. Geisel escolheu continuar enchendo o copo do pinguço, ao invés de levar o mesmo ao hospital, para assim evitar um coma alcoólico. Portanto, o plano foi apelidado de “Marcha Forçada”.

Para tentar manter as taxas de crescimento do “milagre” foi desenvolvido o II PND (II Plano Nacional de Desenvolvimento), pelos ministros Mário Henrique Simonsen (Fazenda), Severo Gomes (Indústria e Comércio) e João Paulo Reis Velloso (Planejamento), cujo foco era o setor energético e a indústria de bens de capital. Os recursos viriam da iniciativa privada nacional e das empresas estatais (o que evidencia o caráter nacionalista do plano), do BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) e de empréstimos externos (os chamados “petrodólares”, utilizados em sua maioria para a importação dessa commodity), mesmo com o relativo aumento dos juros internacionais.

Cabe ressaltar o grande aumento da intervenção estatal na economia durante esse período, o que chegou a incomodar até mesmo os setores prioritários para o governo e que recebiam desde linhas de crédito especiais do BNDE a até mesmo proteção contra a concorrência de produtos estrangeiros. Geisel, em comparação a Médici, no que se refere a questão de assuntos econômicos era muito mais fechado ao setor empresarial. Durante o governo de seu antecessor, contudo, os grupos empresariais passaram a controlar um grande número de burocratas do governo, que faziam valer os interesses daqueles. Mesmo com a redução das ligações entre o Planalto e os empresários, a corrupção persistia. Um exemplo disso era o da família do então presidente da Eletrobrás Antônio Carlos Magalhães (ACM) que foi beneficiada com a construção de um polo petroquímico na Bahia.

As estatais atingiram sua máxima importância durante o governo Geisel, como pode ser visto no gráfico abaixo. No setor energético, elas foram de suma importância para o desenvolvimento do “Pró-álcool” e para a construção das usinas nucleares de Angra.

Com o passar dos anos, o governo percebeu que as metas de crescimento do II PND dificilmente seriam alcançadas, uma vez que o cenário externo, devido aos desdobramentos dos choques do petróleo, não estava nada favorável, sem falar do nível de endividamento do governo e da inflação que começavam a crescer.

As consequências da “Marcha Forçada” foram terríveis para o Brasil, no longo prazo. O crescimento da dívida externa, proveniente do uso de petrodólares para importar gasolina, uma vez que a produção nacional, monopolizada pela Petrobras, não era capaz de atender a crescente demanda interna. Em 1979, com o aumento das taxas de juros internacionais, a dívida acumulada durante esse período seria multiplicada, levando o Brasil a decretar moratória, em 1982.

O crescimento da inflação acabou por corroer o poder de compra da população. Isso ocorreu devido ao grande número de empréstimos para empresas e pessoas físicas, por parte do Banco do Brasil, BNDE e de bancos comerciais que aumentaram a quantidade de dinheiro na economia. A emissão de títulos públicos também contribui não apenas para o aumento da inflação, mas para a elevação da dívida pública. Esses títulos eram utilizados para cobrir os crescentes gastos do governo para o andamento do plano.

O favorecimento de setores considerados prioritários para o crescimento do país acabou por proteger empresas nacionais ineficientes, o que reduzia a concorrência, elevando o preço dos produtos, assim como a qualidade dos mesmos. O aumento do poder e da criação de empresas estatais só fez crescer o grande número de funcionários públicos, que só incharam os gastos do governo e tornaram as mesmas ainda mais ineficientes.

No final, Geisel poderia ter adotado uma dose de livre mercado na economia, como fez Pinochet (seu equivalente chileno). Enquanto o Brasil vivia o II PND, o Chile estava sendo orientado pelas políticas econômicas dos Chicago Boys, que causaram, no curto prazo, desemprego (principalmente na iniciativa pública, devido as demissões e privatizações), inflação e baixo crescimento econômico.

No Brasil, nesse período inicial da implantação do plano, as taxas de emprego e crescimento seguiram em alta. Contudo, a longo prazo, os brasileiros tiveram que amargar uma inflação crescente e perda do poder de compra, enquanto os chilenos puderam desfrutar de um período de crescimento sustentável, com inflação baixa.

Portanto, muitas vezes vale comprometer o crescimento econômico agora, por mais doloroso que seja, para que no futuro ele seja ainda mais robusto e duradouro. Geisel, entretanto, optou pelo caminho de curto prazo, não muito diferente do que a maior parte dos políticos faz.


Autor: Mateus Maciel é estudante da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ e membro fundador do Grupo Frédéric Bastiat (EPL-UERJ).

As informações, alegações e opiniões emitidas no site do Clube Farroupilha vinculam-se tão somente a seus autores.

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