Na Grécia Antiga, os sofistas eram mal vistos por cobrarem pelos seus serviços de ensino da filosofia e retórica. Atualmente, o ato de cobrar por serviços prestados é completamente normal e geralmente encorajado (principalmente entre libertários), por tratar-se de uma troca voluntária entre indivíduos. A prostituição, porém, não seguiu o mesmo caminho, embora possua a mesma natureza: trocas voluntárias. Uma das profissões mais antigas do mundo ainda sofre com os estigmas do passado.

Feministas sex-positives, principalmente no início da década de 80, lutaram pela liberdade sexual como forma de libertação feminina. Isto é, a mulher precisa ter a liberdade para escolher o que fazer com seu corpo e sua sexualidade, inclusive usar como mercadoria. Ao contrário do que é defendido por feministas sex-negatives, o machismo e objetificação feminina não existem por existirem prostitutas, mas sim as prostitutas são objetificadas e marginalizadas por culpa do machismo. Culpar as escolhas individuais por reforçar uma opressão é tolher a liberdade de escolha dessas mulheres, obrigando-as seguir um padrão pré-estabelecido de comportamento, é lutar contra a sujeição das mulheres aos homens, mas sujeita-las a outras mulheres. Wendy McElroy, feminista individualista, afirma que se as feministas sex-negatives estão preocupadas com a segurança e a dignidade das mulheres, elas devem unir forças com as prostitutas e ajudá-las a sair das sombras em que agora vivem e trabalham. [1]

A prostituição deve ser vista como qualquer outra profissão. Martha Nussbaum, influente filósofa, em “Pela razão ou Preconceito: ganhar dinheiro com o uso do corpo”[2], compara a prostituição a seis outras profissões que considera possuírem características semelhantes. Um exemplo é a empregada doméstica que sofre com baixos salários, não possuem tanta liberdade em relação a como exercer suas atividades (devem seguir ordens dos clientes) e ambas sofrem com o estigma social, por motivos distintos, de praticarem a profissão. Nussbaum defende ainda que não há razões racionais para ser a favor da criminalização da prostituição e cita que as principais causas para o preconceito são: a imoralidade (a aversão ao sexo sem fins reprodutivos) e a hierarquia de gênero (ideia de que homens devem estar no controle da sexualidade das mulheres). Os motivos são antagônicos ao libertarianismo por ferirem o direito à autopropriedade, por visarem impor um conceito individual de moralidade a coletividade e por serem contrários a base do livre mercado: as trocas voluntárias e mútuas.

Para Murray Rothbard, em “A Ética da Liberdade”, o livre mercado baseia-se na troca mútua benéfica de bens, ou como ele se refere, de títulos de propriedade (trocar uma maçã por uma pêra, por exemplo, é trocar o título de propriedade da maçã pelo da pêra). Esse argumento gera a afirmação, perversa para alguns, que o trabalho é, então, uma mercadoria. E Rothbard contrapõe: “a realidade natural é que o serviço é de fato uma mercadoria, pois, como no caso de propriedades tangíveis, o serviço de uma pessoa pode ser alienado e trocado por outros bens e serviços. O trabalho de uma pessoa é alienável, mas sua vontade não é. Além disso, é melhor para a humanidade que seja assim; pois esta alienabilidade significa (1) que um professor ou um médico, ou seja quem for, pode vender seus serviços por dinheiro; e (2) que os trabalhadores podem vender aos capitalistas por dinheiro seus serviços de transformar bens. Se isto não pudesse ser feito, a estrutura de capital necessária para a civilização não poderia ser desenvolvida, e os serviços de importância vital de uma pessoa nunca poderiam ser comprados por seus semelhantes.”. [3]

A prostituição, portanto, não fere nenhum direito natural e inalienável, pelo contrário, é pela existência deles que a prostituição não deve ser criminalizada. O Estado não deve violar esses direitos e ao criminalizar uma profissão, como qualquer outra, usa seu poder –ilegítimo- para invadir a propriedade, direito tão defendido pelos libertários.

No Brasil, felizmente, a prostituição não é crime. Entretanto o Código Penal, Cap. V, artigos 227 a 231 prevê como crime: a indução de outrem à prostituição, o favorecimento, o mantenimento de casas, tirar proveito ou traficar prostitutas. Entretanto, esses artigos são amplamente mal interpretados e podem criminalizar pessoas que dependem da renda advinda da prostituição, filhos por exemplo. Além de não haver uma distinção correta entre prostituição e exploração sexual. McElroy afirma que leis contrárias a atividades ligadas a prostituição são, na verdade, leis contra as mulheres. Proibir, por exemplo, que existam bordeis, submete que o exercício da prostituição deva ser na rua, expondo as prostitutas à violência e negando um local seguro de trabalho. Colocando, inclusive, essas mulheres (ou homens) numa situação de vulnerabilidade e isolamento. [4]

 

Autora: Thieli Wildgrube, estudante de Engenharia Química na UFSM e Coordenadora de Comunicação do Clube Farroupilha.

Referências:

[1] McElroy, Wendy. An Overview of “Solutions” to Prostitution. Disponível em: http://www.wendymcelroy.com/articles/prostsol.html. Acessado em 13/12/16.

[2] NUSSBAUM, Martha. “Pela razão ou preconceito: ganhar dinheiro com o uso do corpo”. In: Themis. Direitos sexuais. 1. ed. Porto Alegre: Themis, 2002. p. 13-55.

[3] ROTHBARD, Murray N. A Ética da Liberdade. Capítulo 7: Relações interpessoais: troca voluntária. Página 99.

[4] McElroy, Wendy. An Overview of “Solutions” to Prostitution. Disponível em: http://www.wendymcelroy.com/articles/prostsol.html. Acessado em 13/12/16.

 

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