Sem demagogia, sem populismo e sem firula, o que significa o corte de 30% do orçamento público para universidades federais?
 

      Em quatro meses de governo, Bolsonaro perdeu 29% de aprovação (Ibope). Muito, para quem prometeu ser o Messias do Brasil. Mas nada muito longe do esperado, já que esse se propôs a ser um governo reformista. Poucos esperavam que as reformas chegassem tão cedo à educação superior.

     Como o próprio chefe, o novo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, possui uma péssima assessoria de imprensa. Isso se comprovou quando o ministro declarou, em entrevista ao Estado de S. Paulo, que haveria contingenciamento de 30% no orçamento de algumas instituições de ensino federais, e o motivo para tal seria porque algumas destas promovem eventos com “balbúrdia”.

    Sem tardar, o ministro recebeu todo xingamento catalogado por Aurélio. E a solução para calar os argumentos de que o corte foi intencionalmente direcionado às instituições que são abertamente contrárias ao governo. Se foi retirado parte dos privilégios de uns, retire-se de todos.

    Então, na última terça-feira, 30, foi anunciado o enxugamento de 30% do orçamento de todas as universidades federais, por ora.

    É importante ressaltar que, contrariamente ao que muito se ouve, esta será uma ação de contingenciamento, não corte de verba. Ou seja, ao passo que a situação fiscal do país se estabilize, com a aprovação da reforma da previdência e outros reajustes de contas, o investimento na educação voltará ao normal.

De que parte do orçamento das universidades essa verba será contingenciada?

      É importante dividirmos o orçamento das universidades em duas partes:

      – Obrigatório: São despesas que não podem ser realocadas, como salários dos servidores, benefícios, etc., que representam aproximadamente 80% do orçamento do ensino superior.

      – Discricionário: Despesas voltadas ao desenvolvimento de pesquisa científica e melhoria do ensino. Esse tipo de despesa é inversamente proporcional às obrigatórias, ou seja, quanto maior a despesa obrigatória, menor a discricionária.

     Tendo isso em mente, analisemos a situação: Um gasto gigantesco com despesas fixas, pela enorme quantidade de servidores e seus benefícios infindáveis, ao mesmo tempo que há pouco recurso para pesquisa e aprimoramento do ensino.

     O orçamento da educação é um cobertor curto, que foi puxado para cobrir a cabeça, e os pés ficaram de fora. E, pelo fato de o orçamento obrigatório ser intocável (ou seja, pelo fato de os servidores públicos federais não poderem ser demitidos nem terem seus benefícios reajustados), haverá um contingenciamento dos recursos para pesquisa e aprimoramento do ensino.

     De acordo com o ministro, o contingenciamento não afetará despesas obrigatórias. “O corte  será somente sobre a parte discricionária. A folha de pagamentos está integralmente preservada. O refeitório está integralmente preservado.”, disse o ministro no Senado, na terça-feira, 7, sobre o planejamento para o MEC (https://youtu.be/TfkUcvjFeg0).  Será, portanto, incidente sobre as despesas discricionárias, ou seja, não passará de 6% das despesas totais da universidade, no pior dos casos.

    Também vale lembrar que o contingenciamento não será somente nas despesas de ensino superior, mas em toda e qualquer verba discricionária passível de redução. O Brasil não tem mais condições de se sustentar, despesas precisam ser reduzidas até que as reformas sejam aprovadas.

Os dados da UFSM

      A UFSM está acima da média nacional. Seu custo para a união foi, em 2018, de R$1.19 bilhão de reais, sendo 88% da despesa direcionada para pessoal (ativos e inativos).

Despesas
Despesa
Valor executado em 2018 (em milhões de reais)
 
Valor Previsto para 2019 (em milhões de reais)
Pessoal
R$ 1.003,84
 
R$ 1.047,94
Custeio
R$ 118,62
 
 R$ 130,04
Investimentos
R$ 31,88
 
R$ 12,92
benefícios de pessoal
R$ 31,73
 (divulgado junto às despesas de folha)
Total
R$ 1.230,17
 
                        R$ 1.190,90
Tabela com os dados orçamentários divulgados na coletiva de imprensa da LOA 2019 da UFSM

      Observa-se, portanto, que, na UFSM, assim como em diversos outras universidades federais, houve um excessivo investimento em pessoal, que foi visto, erroneamente, como a melhor forma de aumento de qualidade da educação superior, em detrimento do investimento em pesquisa e desenvolvimento. O alto número de profissionais custa muito aos cofres e custa muito ao desenvolvimento dos alunos.

      O investimento em ensino superior está mal distribuído, mal gerido e é totalmente ineficiente. Há um excesso de pessoal e há a impossibilidade de demissão por ineficiência, o que acarreta em uma única opção, quando há crise fiscal: cortar verba de custeio e investimento. Ao mesmo tempo que há milhares de péssimos professores com gordas folhas de pagamento, não há dinheiro para pagar a luz e financiar pesquisa.

      O problema não é o corte de R$46 milhões (4% do repasse total à universidade), mas na má alocação de recursos. Se esse R$1,19 bi tivesse sido bem alocado, em mais investimento e menos ineficiência de pessoal, hoje não seria um problema esse pequeno corte no orçamento total.

 

Por que há um investimento tão alto em ensino superior?

     O segundo ponto do meu argumento é de discussão igualmente importante: o investimento na educação está sendo feito de forma completamente errada.

    Você pode perguntar: mas o investimento em educação não é a base para o desenvolvimento da sociedade? Vamos investir, então, 100% do orçamento em ensino superior? (ironia)

      Existem dois problemas muito graves em haver investimento desproporcional em ensino superior, em detrimento do ensino básico:

  1. 7,2% da população acima de 15 anos analfabeta (IBGE, 2018);
  2. Forma-se muito mais profissionais do que a demanda por mão-de-obra especializada;

      E uma parte disso é perceptível quando pegamos um Uber e o motorista é um engenheiro, um mestre em letras, um técnico de informática. Não é atoa que, durante o tempo que me voltei à área da tecnologia, escutei até de meus professores que estudaram cinco anos de engenharia para aprenderem a se virar de outro jeito.

       Um outro resultado de um excesso de mão-de-obra especializada, aliada a uma falta de liberdade para empreender e inovar, é  exportação dela. Faz-se gordos investimentos no exterior. Nós estamos exportando as mais brilhantes mentes do país, enquanto a riqueza do país está estagnada e 11,8 milhões de brasileiros são analfabetos. Mas afinal, hoje, essa diferença do investimento em educação básica é assim tão grande? Analisemos os números:

 

SUBÁREA (SUBFUNÇÃO)
 VALOR EXECUTADO
      PERCENTUAL (%)
Ensino superior
R$29.646.098.104,22
31.01%
Transferências para a educação básica   
R$15.314.253.605,44
16.02%
Serviços financeiros
R$11.483.321.518,18
12.01%
Ensino profissional
R$10.265.803.697,67
 10.74%
Assistência hospitalar e ambulatorial
R$7.757.193.473,37
8.12%
Outros
R$21.123.801.152,04
22.10%
Total
R$95.590.471.550,92
100,00%
Distribuição do orçamento para educação, por subárea (2017). Fonte: Portal da Transparência

       O recurso financeiro federal voltado à educação superior é 94% maior que o voltado à educação básica. Porém a quantidade de alunos matriculados no ensino superior federal era, em 2017 de 5,3 milhões (Censo da Educação Superior), enquanto na rede de educação básica pública, 39,7 milhões, no mesmo ano (Censo Escolar).

      Isso significa que temos um investimento federal de R$5.595,83 por aluno, no ensino superior, e R$385,55 por aluno, no ensino básico.

      Temos um Estado enorme, com impostos absurdos. Não há de onde tirar mais verba, não existe demanda de mão-de-obra, estamos investindo no exterior sem retorno e temos quase 12 milhões de analfabetos. Além disso, as despesas obrigatórias no ensino superior são muito grandes e congeladas, é necessário que haja a possibilidade de redução de tais despesas, seja no corte de privilégios, seja na demissão de funcionários ineficientes.

 

Fontes:

– Ibope

– Decreto 9741/19

– BGU 2017

– IBGE

– LOA 2019

– Portal da Transparência

– Censo da Educação Superior 2017

– Censo Escolar 2017

 

Autor: Ian Storni 

 

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