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*Por Fabrício Sanfelice

Ainda no Século XVI, John Locke fundamentou o direito natural e nos trouxe o que até hoje é o tripé basilar das cartas constitucionais mais bem-sucedidas das sociedades modernas: vida, propriedade e liberdade. Por serem naturais, esses direitos existem muito antes de qualquer legislador os colocar em um pedaço de papel e chamar de lei. Elas existem pelo simples fato do ser humano existir. O direito natural não é uma necessidade criada, como a educação, a saúde ou o transporte; ele é sentido em nosso íntimo.
Todos nós sabemos quando temos um desses três direitos atentados; não precisamos de nenhuma constituição ou lei dizendo quando isso acontece: o simples fato do desconforto de ter a sua liberdade tolhida, o seu patrimônio que foi conquistado com o suor do seu trabalho tomado ou uma ameaça real a sua vida, nós sentimos isso internamente, sem a necessidade de alguém nos dizer que isso está acontecendo.

Ultimamente, porém, tem-se visto cada vez mais movimentos em favor do pixo, alegando que é uma atitude nobre e legítima de exercício da liberdade de expressão por aqueles que não tem acesso aos meios de comunicação de massa como jornais, revistas, televisão, etc. Porém, esquecem-se que vida, liberdade e propriedade se complementam e estão em pé de igualdade, sem haver sobreposição de um princípio pelo o outro. Não é possível querer exercer a sua liberdade invadindo a alheia ou atentando contra a propriedade ou vida de outra pessoa. É um preceito básico.

Ainda assim, em pleno século XXI algumas pessoas arrogam-se na posição de impor uma moralidade própria que atenta contra dois desses princípios fundamentais, liberdade e propriedade.A justificativa é banal e vazia: o pobre ou trabalhador explorado pelo “sistema” tem o direito de atentar contra ele e contra a “burguesia” que sustenta e se aproveita dele (o sistema). Já que ele não é assistido pelo estado, e que, devido a essa falha da sociedade há legalidade e legitimidade em invadir o direito alheio para “se manifestar”.

Algumas perguntas me surgem quando leio esse tipo de justificativa: se eu não consigo exercer de maneira efetiva um direito, teria eu direito de invadir o alheio? Perde todo o valor a ideia de que a minha liberdade termina onde começa a do próximo? O que difere a parede de uma casa da lataria de um carro, ou da roupa de uma pessoa? Se alguém se sente no direito de alterar a fachada da casa de alguém para expressara sua opinião, poderia eu, munido de um balde de tinta e pincel, pintar as casas dos meus vizinhos das cores que eu prefiro, sem me importar com a liberdade de escolha deles e desrespeitando o direito de propriedade de quem trabalhou para adquirir aquele bem e o dispor como bem quiser?

A lógica dos pixadores é extremamente autoritária. Não importa se a casa é sua e se você quer ela amarela. Ela será pixada, pois o gosto do pixador deve prevalecer sobre o do morador. Seria esse o conceito da luta de classes tão pregada pela iluminada esquerda universitária? O dono do imóvel numa eterna luta apagando os pixos e tentando manter no seu controle o que adquiriu com o seu trabalho e o pixador numa eterna imposição ditatorial sobrepondo o seu desejo ao do morador do imóvel? Baseado em que princípio, lógica ou moralidade o pixador, que nada contribuiu para a aquisição e manutenção daquela propriedade, tem direito de impor a sua vontade sobre a mesma? Provavelmente baseado em nada.

É preciso fundamentar as nossas opiniões em princípios e não utilizar casos específicos e convenientes para impor a nossa vontade. Não é possível, principiologicamente, defender a interferência em uma parede (propriedade) e não defender a interferência na lataria de um carro (propriedade) ou na roupa de alguém (propriedade). A lógica principiológica aplica-se a outros campos, não podemos ser dado o direito de se manifestar na propriedade alheia apenas as ditas “vítimas” sociais ou quem a quem tem um pensamento ideologicamente compatível com os marginais que praticam tais atos. Parece-me que a única manifestação permitida é a anti-capitalista. Caso exista qualquer possibilidade de uma manifestação de pixo pró-sistema, ela deve ser vetada e considerada “imoral” por esse grupo que de moralidade, só conhece a sua própria. Você trocou a propriedade do seu trabalho pela propriedade de um bem. Você cedeu horas da sua vida por um bem. Então, baseado em que, alguém que de nada contribuiu para a aquisição do seu bem, se arroga na posição de te destituir ou interferir no seu usufruto da propriedade?

Se me é permitido interferir na parede da casa de alguém, que trabalhou e pagou por aquele bem para usufruir como quiser, então também me seria permitido interferir em outros aspectos da sua propriedade que me desagradem. Desde o carro citado no parágrafo anterior, até uma peça de roupa. Ambos são propriedades.

Não há problema no pixo, no grafiti e nas expressões alternativas em si, desde que haja consentimento do proprietário do bem utilizado para manifestação, sem imposição autoritária da sua vontade sobre a de outra pessoa.

Enfim, o fato de qualquer pessoa considerar que não consegue exercer o seu direito de maneira plena, como alegam os defensores do pixo, não dá a ela o direito de violar o direito alheio para tentar exercê-lo. O fato de você não ter uma casa própria não lhe dá o direito de invadir a residência de outrem. Pensar dessa maneira é ir contra os três princípios básicos citados no início desse texto, e isso nada mais é que uma conduta criminosa. Para os defensores do pixo, é preciso repensar esse movimento ou aboli-lo. Não há como falar em falta de liberdade de expressão ou em não ser ouvido na sociedade digital. A internet deu acesso universal a todos os tipos de manifestação e a possibilidade de todos se manifestarem e atingirem um número inimaginável de pessoas. Assim, se suas ideias não recebem a atenção que você acha que deveriam ter em outros meios, é possível que elas não sejam dignas de mais atenção, e impô-las em vias públicas não passará de autoritarismo.

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