Quando em 1789, George Washington foi eleito para o cargo de presidente dos Estados Unidos da América, uma nação concebida sob a ótica da liberdade e descentralização, isto é, voltado principalmente para questões de defesa e algumas outras poucas funções administrativas. Poucos imaginariam que hoje, passados 230 anos daquela data, os Estados Unidos teriam se tornado um império de dimensões globais, que sem resquícios da sua antiga postura isolacionista, ataca por meios diretos e indiretos toda e qualquer nação que ouse se distanciar de seu espírito democratista. A liberdade geralmente não é perdida da noite para o dia, como em um golpe de foice, mas sim aos poucos, quase que de maneira imperceptível e geralmente com a promessa de que esse ou aquele aumento do poder central é meramente temporário, nada com que a população deva se preocupar.
Uma noção idealizada de algo pode ser extremamente útil para um discurso ou para a composição de um mito fundador, mas é extremamente maléfica para a compreensão de um fenômeno histórico. A imagem popular, difundida especialmente no meio liberal, de que os founding fathers (pais fundadores) eram todos entusiastas da ideia de um estado mínimo, defensores do livre comércio internacional e da descentralização estatal esbarra na pessoa de Alexander Hamilton, primeiro secretário do tesouro dos EUA e uma figura chave para entender como os Estados Unidos desviaram-se tanto das promessas da liberdade.
A ideia inicial que se tinha para o governo dos Estados Unidos da América era a de uma confederação, com um governo central focado na proteção militar, mantendo a soberania dos estados. Porém entre a ideia e a realidade existe um grande abismo, e embora não se possa ver uma marca profunda de um centralismo radical na transição da confederação para a união, já se percebia o ânimo de nulificação das instâncias inferiores pelas instâncias superiores. A primeira manifestação concreta desse ânimo foi o First Report on the Public Credit, evento no qual Hamilton sugeriu que as dívidas dos Estados fossem assumidas pela União. Embora essa medida supostamente ajudasse a situação do crédito público dos Estados, na prática, serviu para que a União começasse a exercer um maior poder de influências sobre os estados.
Durante o período que precedeu a Guerra Civil, houveram inúmeras violações dos princípios fundantes dos Estados Unidos, em especial a Compra da Louisiana, que expandiu não só os poderes presidenciais, mas também os poderes da União, uma vez que os novos estados não seriam mais unidades autônomas que aderiram à União por livre decisão e vontade, mas sim unidades formadas pela União (modificando portanto a fonte dos direitos dos estados). Outros eventos que foram decisivos para a centralização do poder e para a relativização do isolacionismo foram, respectivamente, a usurpação feita pelo poder judiciário no caso Marbury vs. Madison e as guerras expansivas dos Estados Unidos contra o México.
A décima emenda da constituição americana estabelece que “os poderes não delegados aos Estados Unidos pela Constituição, nem por ela negados aos Estados, são reservados aos Estados ou ao povo”, e foi em torno desta redação que se deu o embate da secessão dos estados do sul no período da guerra civil americana. O estados do sul sustentavam o argumento de que por não ter nenhuma previsão quanto a manutenção da União na constituição, com base na décima emenda, eles poderiam separar-se sem que o governo central pudesse opor forças contra isso. Porém, mais uma vez ocorreu uma vitória tanto jurídica quanto militar do centralismo, tendo por único consolo o fim da escravidão nos EUA.
Após o fim da guerra civil americana, o protagonismo do governo central durante a reconstrução tornou-se cada vez maior. E foi na era progressista que os Estados Unidos de Washington foram sepultados. O isolacionismo foi substituído por uma postura mais agressiva, primeiramente ante a América Latina, durante a Guerra das Bananas, e depois ante o mundo durante a Primeira Guerra Mundial. A presidência americana sofreu um redesenho, em especial nos mandatos de Theodore Roosevelt, com o fortalecimento do executivo e o aumento da regulação por meio de decisões administrativas, e Woodrow Wilson, que pregava uma maior proeminência para o executivo e a guerra como um meio para a paz. A ideia de respeito à propriedade foi sepultada pela décima sexta emenda, que estabeleceu o Imposto de Renda Federal, no mesmo ano (1913) em que estabeleceu-se o FED, o banco central americano. Todas as ações de Roosevelt, o New Deal, o confisco do ouro, a entrada na Segunda Guerra Mundial e o aumento na regulamentação da economia já possuíam lastros nas atuações passadas da presidência, tendo ele apenas aprofundado ainda mais a distorção do ideal americano.
Outro presidente americano, Thomas Jefferson, postulou que o preço da liberdade é a eterna vigilância. Nos Estados Unidos modernos, o governo espiona a sua população, controla sua economia, vasculha suas finanças pessoais e os impede de comprar armas. De fato, o que separa a América de Washington da América atual não é apenas um espaço de tempo, mas sim o preço da não vigilância.
Autor: Eduardo Peixoto
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