Pouco menos de um mês atrás um livro – pasmem – de economia (O Capital no Século XXI) do francês Thomas Pikkety atingiu a lista dos mais vendidos no site da empresa de varejo digital Amazon. Não demorou muito para o mesmo ser aclamado academicamente nos EUA por Paul Krugman e seus seguidores. A despeito do seu sucesso literário a questão maior e mais intrigante (ao menos em um primeiro momento) é entender o que fez tanta gente se interessar pelo fantasioso mundo da Ciência Econômica?

É simples, basta que entendamos o que a obra de Piketty propõe! Segundo o francês (e claro, Paul Krugman) o livro consegue comprovar – teoricamente e empiricamente – que a prosperidade do capitalismo tende a elevar a concentração da renda e o aumento da desigualdade entre ricos e pobres. Isso se desenrolaria empiricamente pelo fato de que, segundo Piketty, toda vez que a remuneração do capital se torna maior do que o crescimento econômico os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres. E mais, segundo Piketty, as evidências históricas nos mostram que isso é praxe no capitalismo! Ou seja, estaríamos em meio a um sistema de produção econômico em que a desigualdade aumenta inexoravelmente à medida que este se desenvolve no tempo. Isso, para o francês, enseja que o capitalismo necessita urgentemente de reformas para que tais desigualdades sejam atenuadas e a proposição (nada surpreende, diga-se de passagem) é que taxemos a riqueza global em 2% e os ricos em, progressivamente, 80%!

Evidentemente, que tal proposição por si só, ou seja, independente de comprovação empírica, já conquistaria adeptos das teorias em que a riqueza é um jogo de soma zero. Se alguém está rico é porque outro alguém ficou pobre. Alguém tem que perder e assim é o capitalismo – dizem eles. Mas o que mais fez o livro de Piketty se tornar um best seller está no fato da sua (suposta) irrefutabilidade empírica alicerçada em uma (suposta) base fantástica de dados.

Mesmo sem ler o livro de Piketty (algo que eu confesso não ter feito), aprioristicamente, já se pode alertar para algumas conclusões no mínimo falseáveis do livro. Em primeiro lugar, como já alertava-nos A. F. Chalmers e Ludwig von Mises nas Ciências Sociais e nos processos derivados destas a empiria não pode refutar uma boa teoria. Eis o primeiro pecado de Piketty, achar que de uma visão holista sobre dados históricos a sua teoria estaria verificada e as demais refutadas. Ledo engano!

Primeiro porque seus dados quando melhor examinados pouco dizem acerca do capitalismo e de sua inerente (e suposta) concentração de renda. Isso porque (segundo os dados de Piketty) no período de 1820 a 1950 a remuneração do capital simplesmente diminuiu e o crescimento econômico aumentou, portanto, a concentração de renda (seguindo a tese teórica de Piketty) nesse período se desconcentrou e não o contrário! Além disso, de 1913 a 1950 o crescimento econômico supera a remuneração do capital o que refuta ainda mais a tese central do francês. Tal efeito concentrador só passa a ser verificado por volta de 1980 e ainda assim em pequena escala (para ver os dados, clique aqui). Mas e quanto ao resto dos dados? E antes de 1820? Antes, o capitalismo sequer estava desenvolvido! O que Piketty no máximo consegue verificar empiricamente é que nos períodos pré-capitalistas (do séc. XI a 1820) as sociedades eram extremamente desiguais e concentradoras de renda e que isso diminui, drasticamente, após a prosperidade do capitalismo.

Existem outras refutações as conclusões empíricas de Piketty! De cara podemos dizer que segundo os dados contidos no livro durante 1910 a 1970 a concentração de renda dos 10% mais ricos cai vertiginosamente para níveis menores do que em 1810 tanto na Europa como nos Estados Unidos (regiões onde o capitalismo nesse período mais prosperou). Enfim, o que o economista francês conseguiu comprovar é aquilo que todos que leram Mises, Hayek e outros já sabem. Que o capitalismo é quem produziu e distribuiu riqueza como ninguém e que só não prosperou ainda mais porque sempre foi vilipendiado pelo intervencionismo ao qual sempre esteve exposto. Para que comprovemos isto basta que usemos, novamente, os dados de Piketty. No livro, os dois períodos de maior concentração de renda dentro do capitalismo estão associados às crises de 1929 e de 2008, ou seja, nos períodos precedentes as duas maiores crises do intervencionismo (se o leitor ainda acha que a crise de 1929 e a de 2008 são crises do capitalismo ler, respectivamente: aqui eaqui).

E é este o principal equívoco de Piketty! Esqueçamos a sua malfada teoria e vamos aos fatos. Toda a sua análise versa sobre dois períodos: um antes do advento do capitalismo como sistema de produção e o outro após o seu surgimento. No entanto, tecer inferências empíricas de 1820 pra cá (ou se preferirem da primeira Revolução Industrial para cá) é realizar análises acerca do intervencionismo! E esta ressalva o francês não faz. Seus dados versam sobre um período majestosamente dissecado teoricamente por Ludwig von Mises em Intervencionismo: Uma Análise Econômica e não sobre o capitalismo.

Ou seja, quisesse fazer uma análise honesta sobre o capitalismo Piketty teria que esquecer seus dados e voltar aos livros. Ler Menger, Böhm-Bawerk, Wieser, Lachman, Mises e Hayek. Após fazer isso (e somente após) ir para os dados. O francês concluiria que o capitalismo que agora o enriquecerá não é um jogo de soma zero. Que tirar 80% de Thomas Piketty e dar para o Felipe Rosa em nada adianta para diminuir a presente desigualdade no mundo. A desigualdade só será eficazmente combatida com aumentos da produtividade e da eficiência do livre mercado. É o capitalismo livre que torna economias paupérrimas em nações prósperas e desenvolvidas.

Logo, enquanto teorias como a de Piketty continuarem encontrando coro entre os economistas o intervencionismo seguirá impavidamente concentrando a renda que o livre mercado (através de todos nós) produz, apenas a espera de um próximo teórico que encontre no capitalismo toda a culpa para as mazelas do mundo. No século XIX foi Marx, depois Keynes e agora Piketty. Por que eles simplesmente não deixam nossas carteiras e o capitalismo em paz?

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Felipe Rosa é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Economia e Desenvolvimento (PPGE&D) da UFSM. Escreve as quintas para o site do Clube Farroupilha

As informações, alegações e opiniões emitidas no site do Clube Farroupilha vinculam-se tão somente a seus autores.

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