Apesar de muitos culparem a má gestão de bancos, seguradoras e empresas de avaliação de ativos pela crise de 2008, boa parte esquece a culpa do estado em turbinar o ambiente financeiro para que a crise acontecesse. Um exemplo pode ser visto no comportamento do mercado americano em setembro e outubro de 2008.
Após o banco Lehman Brothers fazer o pedido de falência, o mercado de empresas financeiras entrou em liquidação de ativos pois viu que o governo americano não iria mais contribuir para evitar falência de bancos e empresas financeiras. Na mentalidade dos gestores das empresas financeiras americanas, qualquer risco de falência seria coberto, pois em março daquele ano o governo ajudou o JP Morgan na compra do Bear Stearns – que envolveu mais de U$$ 25 bilhões em crédito estatal – como também estatizou o Fannie Mae e Freddie Mac. Devido ao pânico, redução bruta de credito, descapitalização e do grande volume de ativos podres no mercado, o governo dos EUA fechou um pacote de resgate de mais de U$$ 400 bilhões, que foi utilizado para compra de papéis podres, evitando assim a insolvência do mercado.
Entretanto, no cenário global, com governos realizando estímulos de crédito semelhantes aos americanos para suavizar o impacto da crise, além de muitos países da Europa operarem com déficit de orçamento, foi percebido o aumento acelerado da dívida pública de vários países. Isso levou a crise de dívida pública na Europa, que pode ser exemplificada nas crises de Portugal e Grécia a partir de 2010.
Devido a essa conjuntura, a União Europeia criou novas regulamentações no sistema financeiro, tentando assim manter a união de mercado do bloco, como também evitar o impacto tributário para a sociedade. Um exemplo é a regra recente que, em caso de um banco ficar sem capital, dinheiro público não deve ser usado para resgate.
Apesar do bom gerenciamento de crise feito pela UE na Espanha nos últimos meses, onde o Banco Popular – um dos maiores do país – declarou em abril que estava ficando sem capital e em junho foi comprado pelo Banco Santander por 1 euro, com o Santander assumindo uma dívida de 37 bilhões de euros – um episódio no final do mês de junho deu ao mercado um péssimo sinal: os resgates do governo italiano aos bancos Veneto Banca, Banca Populare de Vicenza (bancos regionalizados em Veneza) e o Monte dei Paschi (regionalizado em Siena).
No fim de junho, após aprovação da UE, os bancos de Veneza ganharam um pacote de aproximadamente 12 bilhões de euros – 7 bilhões de dinheiro público, somado a crédito estatal que será dado ao banco Intesa, aprox. 5 bilhões, para aquisição – onde terão que cumprir requisitos para assim evitar uma insolvência. Para fazer isso, a UE aceitou a justificativa que o resgate do banco deveria ser feito pelas regras italianas por serem bancos regionais. Sobre o Monte dei Paschi, apesar de injeções de capital feitas no ano de 2016, ele será estatizado e sofrerá uma injeção de 5,5 bilhões de euros, com a possibilidade de serem injetados mais 20 bilhões de euros.
A situação bancária na Itália começa a ficar bastante confusa. Primeiramente, a situação dos resgates italianos se assemelha muito ao que aconteceu nos Estados Unidos antes da falência do Lehman Brothers: o envolvimento do dinheiro público e gestão do poder executivo para manter o sistema bancário. Além disso, soma-se o fato das declarações completamente infelizes das pessoas envolvidas nessa situação. O governo Italiano declarou que salvar esses bancos vai evitar tensão social, como corrida de saques, além do orgulho nacional envolvido – o Monte dei Paschi é o banco mais antigo do mundo em funcionamento.
Já a comissão europeia comenta que os bancos são regionais, ou seja, são pequenos e não afetam o mercado financeiro o suficiente para que haja preocupação. Como assim? Esses bancos são importantes ou não? Outra declaração foi feita pelo ministro de Finanças da Italia, Pier Padoan, onde diz que “(está) confiante que o dinheiro estatal será recuperado, talvez até com juros”. Se há tanta confiança, por que o setor privado não fez aquisição destes bancos como fez recentemente o Santander?
Outro ponto são as regras do mercado. Quais destas estão valendo? Será a da União Europeia ou a regulação de cada país? E na hora que um banco de porte maior precisar de injeção de capital, será novamente utilizado dinheiro público?
Para piorar, a situação italiana não ajuda. A dívida italiana chega aos absurdos 2.2 trilhões de euros, ou cerca de 133% do PIB anual; partidos populistas como o Cinco Estrelas ganharam popularidade nos últimos anos; o país praticamente não cresceu desde 1999, quando adotou o Euro; as taxas de juros já estão zeradas, ou seja, uma crise na Itália neste momento poderia ter um impacto maior que a crise grega e portuguesa, pois envolveria um dos big players da Europa e uma difícil capacidade de reação.
Parece muito que os burocratas italianos estão apenas levando o problema com a barriga. Por mais que salvem o mercado financeiro em um curto prazo, podem estar apenas adiando um problema muito maior, como aconteceu nos EUA. Para que a possível crise não ocorra, políticas mais liberalizantes deveriam ser discutidas. Por exemplo, aceitar que os bancos devem resolver os problemas entre si onde o estado deve apenas garantir uma quantidade de crédito aos seus correntistas e, caso haja uma insolvência, o banco deve fechar. Outro ponto é discutir a própria existência de um banco central, algo pouco debatido e que também agrava a situação com a impressão de moeda.
Como sociedade, devemos ficar atentos a situações como essa. Novamente, podemos estar vendo a formação de mais uma crise criada pelo estado e para piorar, uma crise movida pelos mesmos erros que aconteceram em outros países em um passado não tão distante.
Autor: Diego Pinheiro é graduado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Maria e escreve para o site do Clube Farroupilha mensalmente às quartas-feiras.
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