É perfeitamente possível privatizar e piorar.  Porém, é improvável desestatizar e não melhorar.[1]

Uma das críticas recorrentemente feitas ao capitalismo o atrela a inerente concentração de mercado. Segundo tais delatores (normalmente a mesma turma hilária de sempre) alguns setores produtivos da economia inevitavelmente precisam ser regulados (pelo governo claro) para que não culminem na formação de monopólios e com isso prejudiquem os consumidores. Tal argumentação já foi rebatida aqui, no entanto, existe outra teoria fundamentalmente bem embasada que não apenas contesta que os monopólios concedam privilégios aos ofertantes como rechaça como benéfica aos consumidores a regulação econômica por parte do governo, vamos a ela.

Dentre as teorias da regulação[2] a Teoria da Captura (TC) defendida pela Escola de Chicago, insere-se consideravelmente no caso das agências reguladoras. Segundo essa teoria, o risco na regulação de um determinado setor está na capacidade das empresas que constituem este mercado em “capturar” o órgão regulador em proveito próprio e detrimento dos concorrentes – potenciais ou não.

Logo – de acordo com Chicago – existe uma demanda empresarial por regulação fundamentalmente localizada nos grupos empresarias mais concentrados e com menores custos de organização. Evidentemente, que dessa forma quanto mais concentrado for o mercado, maiores são as chances das grandes empresas se unirem e mancomunarem acordos políticos com as reguladoras, privilegiando e perpetuando movimentos prejudiciais à concorrência através de estímulos para a criação de barreiras institucionais de entrada e saída de empresas, assim como, uma estrutura de tarifas e preços que beneficie os ganhos rentáveis dessas empresas com boas conexões políticas.

Portanto, para a Escola de Chicago quando chegamos nesse ponto as empresas já capturaram a agência reguladora do governo, fazendo com que o arranjo concorrencial no setor transforme-se em uma “troca de favores” entre o órgão regulador e as empresas que o integram. Sendo que artifícios como contribuições políticas e financiamentos de campanha sejam recorrentemente usados como moeda de conversão para as benesses concorrenciais concedidas as empresas reguladas.

Contudo, apesar da Escola Austríaca concordar com o delineamento feito por Chicago, os austríacos o consideram incompleto. A teoria austríaca, portanto, vai além dessa análise, pois a classifica apenas como um primeiro passo rumo à burocracia, logo a EA:

[…] reconhece que as coisas não param por aí; esses acontecimentos, aliás, seriam apenas o primeiro passo de uma armadilha criada pelo governo.  Essa armadilha é montada quando o setor regulado começa a se sentir confortável com seus subsídios, com suas isenções tributárias, com as eventuais tarifas protecionistas, com as licenças exclusivas, enfim, com o que quer que o governo lhe esteja concedendo.  Consequentemente, o setor em questão começará a agir como um genuíno monopolista e diminuir a qualidade do serviço oferecido. Entretanto, tal comportamento gerará um enorme apelo público para que o governo intensifique ainda mais as regulamentações.  Ato contínuo, o setor passará por dificuldades, o que por sua vez gerará uma maior intervenção regulatória, o que por fim levará a um total controle governamental sobre todo o setor, por meio de um arsenal de leis e controle de preços.  É nesse ponto que a armadilha finalmente é ativada.  O mercado é substituído por burocratas e pelo poder estatal.  O governo, cujo objetivo sempre foi o controle total, capturou e aprisionou o setor — sem que tenha havido, em teoria, qualquer estatização.[3]

Dessa forma, para a Escola Austríaca esse arcabouço é altamente pernicioso para a concorrência e os consumidores, afinal, o governo torna-se um meio e um fim na estrutura de mercado. Um meio quando consente com a captura pela empresa regulada e, posteriormente, um fim quando se intitula necessário para corrigir as ineficiências no setor através de mais regulamentação e intervenção.

Mises chamou tal argumento de a lógica do intervencionismo,[4] sendo que, ao fim desse processo o setor caminha em direção a mais regulamentação, morosidade e burocracia tipicamente estatal, algo que desestimula a produtividade, a inovação e a concorrência no mercado, tornando-o menos eficiente na oferta de produtos e serviços prestados aos consumidores.

Portanto, para a EA a solução indicada nesses casos está localizada na extinção de qualquer agência reguladora em qualquer setor ou indústria. Para os austríacos, este requisito torna-se fundamental para que não se abram precedentes para captura e consequentes ameaças a concorrência. Quaisquer semelhanças com o caso da Anatel ou demais reguladoras capturadas e ineficientes no aparato institucional brasileiro não são mera coincidência prezado leitor. O capitalismo só funciona livre e enquanto a intelligentsia e os burocratas de Brasília não perceberem isso, este apenas se concentrará, formando monopólios e cartéis que como bem lembra Henry Simons “[…] a democracia não pode suportar, não pode controlar sem destruir e talvez não possa destruir sem destruir a si própria.

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Felipe Rosa é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Economia e Desenvolvimento (PPGE&D) da UFSM. Escreve as quintas para o site do Clube Farroupilha.

As informações, alegações e opiniões emitidas no site do Clube Farroupilha vinculam-se tão somente a seus autores.

[1] ROQUE, 2010. Ver aqui e aqui

[2] Existem diversas teorias que dispõem sobre a regulação econômica. Três delas possuem maior inserção econômica: A Teoria do Interesse Público; A Teoria Econômica da Regulação; e A Teoria das Escolhas Públicas. Ao leitor interessado em aprofundar-se no estudo das mesmas, recomenda-se a leitura de SILVA, H. O. da. Os sistemas financeiros e a evolução das regras de supervisão bancária. 2010. Dissertação. (Mestrado Profissional em Desenvolvimento Regional e Gestão de Empreendimentos Locais).

[3] ROQUE, 2010.

[4] Ver MISES, 2009, p. 45.

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